O Instituto de Pesca (IP-APTA), da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, desenvolve pesquisas e ações visando ampliar o consumo dos chamados Peixes Não-convencionais (Penacos). Os trabalhos abrangem desde a qualidade nutricional desse alimento, ao aspecto social relacionado à pesca e o potencial de mercado envolvido, com foco no consumo consciente.
"O termo Penacos surgiu em Santos, através de um chef de cozinha que é também um estudioso, Fábio Leal, mas já está em muitos estados", diz Erika Fabiane Furlan, pesquisadora do IP. Como explica, basicamente, os Penacos são espécies de peixes usadas tradicionalmente por populações de pescadores e ribeirinhos, mas que tem menor valor comercial, por não serem usualmente conhecidas e consumidas por públicos mais amplos. "Esse termo já está tão bem estabelecido que pescadores de algumas colônias já se referem às espécies como Penacos", afirma Ingrid Cabral Machado, também pesquisadora do Instituto.
Para Ingrid, a intenção de abarcar essas espécies sob a sigla é uma estratégia para auxiliar na conscientização do consumidor sobre a importância de consumi-los. "O pescador artesanal, que trabalha em baixa escala, em regime de economia familiar, acaba obtendo essas espécies na pesca e encontra dificuldade em comercializar", prossegue. "Há também uma sazonalidade na produção: ele não tem todas as espécies o tempo todo, existe uma flutuação. A ideia é conseguir mercado para esses peixes também", explica.
"Muitas vezes o consumidor não diferencia nem mesmo quais peixes são marinhos e quais de água doce", menciona Erika, para quem muita gente tem dificuldade na escolha do pescado, por não ter o hábito de prepará-lo em casa. "Isso a gente vê nitidamente, por exemplo, quando vai conversar com os jovens, que comem muito fora de casa. Quando você fala de um ingrediente ele não sabe dizer o que é e nem como escolher, porque não tem o hábito de cozinhar. Às vezes os próprios pais já não tinham mais", exemplifica. A pesquisadora constata que, no geral, o consumidor brasileiro muitas vezes não conhece nem mesmo as espécies convencionais de pescado, limitando-se ao salmão, ou tilápia (comercializada como Saint-Peter), por exemplo.
"As pessoas, muitas vezes, sequer conhecem os peixes que são pescados ou produzidos na própria região", adiciona Ingrid, lembrando que mesmo em cidades do litoral de São Paulo, é mais regra que exceção os restaurantes servirem espécies importadas, como a merluza argentina ou a polaca do Alaska, ao invés das encontradas localmente. "O assunto é importante porque falta realmente o conhecimento por parte do consumidor", coloca a pesquisadora.
Já Erika levanta também a questão da sazonalidade de cada espécie e faz uma analogia às "frutas da época". "Assim como muitas frutas têm as estações do ano, o peixe também, pois tem épocas em que está no defeso e não pode ser capturado e tem épocas em que está disponível e é mais facilmente pescado", detalha. Conforme elucida, a observância à essa sazonalidade está relacionada tanto à manutenção dos estoques pesqueiros quanto à qualidade e preço do que está sendo vendido.
Especificamente quanto aos valores encontrados, Erika menciona que esse ainda é um empecilho para maior aceitação do pescado. No entanto, acredita estar havendo melhoras no cenário. "Ainda escutamos do consumidor que o pescado é muito caro, e com menor rendimento quando comparado à carne bovina, por exemplo. Entretanto, como nesse ano tivemos uma alta no preço de algumas carnes, o peixe ficou mais competitivo e, assim, o consumidor que não levava esse produto para casa por causa do preço, começou a levar", assegura. De outro lado, a especialista credita essa maior procura a um apelo à saudabilidade do pescado, fazendo com que as pessoas levem em conta esse valor agregado num momento de preocupação com a saúde. No que diz respeito ao preço, garantem as especialistas, os Penacos são um caminho interessante, por serem espécies que frequentemente são pescadas em quantidade e acabam até mesmo descartadas, por que a indústria não vê valor comercial.
A pesquisadora Ingrid ressalta ainda um outro viés central na questão, o aspecto social. "Consumo responsável tem muito a ver com isso: reconhecer a procedência do pescado e relacionar a uma comunidade que esteja trabalhando em regime de economia familiar, dar preferência a este tipo de processo", enfatiza. A especialista diz que já há restaurantes que trabalham com esse conceito, trazendo ao consumidor o conhecimento de que o pescado que ele está comendo foi obtido pelo trabalho de determinada comunidade, como uma atividade tradicional. Para Ingrid, isso é um processo educativo: levar ao consumidor uma preocupação que não está internalizada. "Nesse nosso universo de consumo, muitas vezes olhamos para os produtos e não enxergamos quem produziu. Existe uma dissociação entre aquilo que nos nutre, o alimento, e aquelas pessoas que o produziram", pondera a pesquisadora.
"Nós participamos de alguns fóruns na nossa região e levantamos frequentemente esse debate: a Baixada Santista é produtora de produtos de origem animal, o peixe está em todo lado, tem-se toda uma cultura da pesca que está estabelecida na região", agrega Ingrid.
O IP, juntamente com a Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS), também da Secretaria, integra o Conselho de Desenvolvimento da Região Metropolitana da Baixada Santista (Condesb), que possui uma câmara temática sobre agricultura, pesca e economia solidária, e está elaborando projetos participativos com comunidades tradicionais, debatendo as oportunidades que podem ser geradas com a pesca artesanal. "Percebemos que o termo Penaco precisa ser popularizado e precisamos ajudar a promover a cultura do consumo dessas espécies. É também uma função nossa, no IP, trazer um pouco dessa preocupação.", enfatiza Ingrid. "Isso, casado com a gastronomia, os restaurantes, pode trazer resultados muito bons", conclui.
Se você se animou em experimentar os Peixes Não-convencionais, confira o nome de alguns deles, indicados por Eliane Diniz, presidente da Colônia de Pescadores Z5 Júlio Conceição, de Peruíbe-SP: Parati, Guaivira, Mandi, Espada, Caratinga, Betara, Acará, Carapau, Maria Luiza, Palombeta, Salteira e Oveva.
Fonte: Portal do Agronegócio, 30 março 2021 (https://www.portaldoagronegocio.com.br/pecuaria/aquicultura-e-pesca/noticias/consumo-de-peixes-nao-convencionais-une-sabor-nutricao-e-fortalecimento-da-pesca-regional)