A pesca comercial no Brasil movimentou US$ 2,06 bilhões em 2007. Desde então, pouco é publicado (pelo menos, oficialmente) sobre a indústria pesqueira nacional. Na foto, uma traineira. (Créditos: Barcos Brasil)
Ao se pesquisar “dados pesca comercial Brasil”, a primeira página descoberta pelo Google é uma do Instituto de Pesca de São Paulo, imerso na Secretaria de Agricultura e Abastecimento. Aponta-se: “O reconhecimento da necessidade do registro desses dados a nível nacional foi explicitada desde o primeiro Código de Caça e Pesca (Decreto nº 23.672, de 2 de Janeiro de 1934)”.
O artigo 57 pontua:
O capitão das embarcações destinadas à pesca de alto mar ou à costeira, deverá remeter às autoridades, no fìnal de cada viagem, um mapa contendo todas as informações relativas à sua navegação, à quantidade e qualidade do pescado colhido, local, data e hora da pescaria e outros dados referentes à natureza dos fundos dos pesqueiros e condições do mar, tempo, assim como tudo mais que possa interessar aos serviços da pesca.
As ditas “informações relevantes” — navegação, quantidade e qualidade do pescado, local e data — são, até certo grau, expostas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, órgão responsável após a extinção do Ministério da Pesca, então encarregado desde 2009.
O problema é a ausência de dados econômicos, por exemplo, referentes aos lucros e custos da produção pesqueira, os quais — no mínimo — estariam implícitos em “outros dados referentes à natureza dos fundos dos pesqueiros” ou “tudo mais que possa interessar aos serviços da pesca”.
Tese de Rodrigues
Rodrigues complementa: “Porque é um negócio próprio do setor. Embora, durante a pesquisa, os respondentes apreciarem relatar sobre os custos (o que auxiliaria a reivindicar auxílios do governo), a parte do ganho é desconhecida. Eles simplesmente evitam que seja revelado”. Um direito justo.
— Mas, o governo tem acesso a esses dados, não teria? Ou eles só não são publicados?
— Eu acredito que, no Brasil, os dados econômicos e financeiros (como os custos e lucros) sobre a pesca são geralmente escassos porque não vem sendo incluídos nos sistemas de coleta de dados estatísticos. A coleta e atualização sistemática da informação priorizam dados referentes à produção por espécie e ao esforço de pesca. Também não se dispunha, até os nossos estudos, de um protocolo amplo e padronizado para coleta de dados econômicos, que auxiliassem à sistematização e organização das informações econômicas necessárias.
De fato, indicadores do desempenho socioeconômico das frotas pesqueiras comerciais não são disponibilizados, muitas vezes são desconhecidos pelo governo, pela comunidade científica, e até mesmo pelo próprio setor pesqueiro. Assim como, em uma matéria redigida pela jornalista brasileira Taisa Sganzerla para a ONG Oceana sobre a pesca brasileira, na manchete consta: “Without Official Data, No One Knows”.
As principais frotas e portos de desembarque analisados na tese de Rodrigues foram:
- A frota de pesca de sardinha em Angra dos Reis;
- As frotas de traineiras, parelhas, potes-polvo, emalhe de fundo, arrasto de fundo de camarão sete-barbas e arrasto de fundo de camarão rosa em Santos e Guarujá;
- As frotas de pesca de dourado, de pesca de atuns e afins, de traineiras, de emalhe de fundo, de arrasto de fundo de camarão-rosa e a pesca com vara e isca-viva em Itajaí e Navegantes (Santa Catarina);
- As frotas de pesca de atuns e afins, de parelhas, de arrasto de fundo simples e de emalhe em Rio Grande (Rio Grande do Sul).
As frotas mais produtivas foram as que pescam os grandes peixes como dourados e atuns (os pelágicos) e as parelhas. Os principais fatores que afetaram a rentabilidade das frotas foram: volume pescado, preço do recurso pescado e custo com combustível. Surpreendeu a descoberta de que as frotas cujo combustível era subsidiado não apresentaram desempenho melhor que as não subsidiadas.
“As frotas que apresentavam um bom desempenho mantinham a mesma performance, mas aquelas cuja lucratividade era baixa também continuaram assim. Talvez alguns pontos da política de subsídio ao combustível para a pesca devessem ser revistos”, comenta Rodrigues. Parte da tese foi resumida em um artigo de fácil acesso na página da web do Laboratório de Ecossistemas Pesqueiros (LabPesq), o qual é coordenado por Gasalla. Mais dois artigos estão em fase de preparação para serem publicados.
“Ela analisou 17 frotas pesqueiras que atuam nos mares da região Sudeste e Sul, comparando-as entre si. Para se ter uma ideia da dimensão do trabalho dela, qualquer artigo aborda, no máximo, uma única frota de número restrito de barcos”, elogia Gasalla. O volume de dados coletados é muito considerado pela orientadora.
Os dados foram coletados através da ida aos portos de desembarque e perguntando aos pescadores e donos das embarcações das frotas pré-selecionadas sobre dados técnicos, esforço pesqueiro, custos e receitas relativos a sua última viagem. Foram usados diferentes protocolos desenvolvidos pelo LabPesq desde 2006, abordados pela primeira vez em um artigo de Gasalla e colaboradores de 2010, publicado na revista internacional Progress in Oceanography.
Fonte: Agência Universitária de Notícias da USP, Jun/2018 (https://paineira.usp.br)
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