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Precisão nas pesquisas aplicadas

Recentemente li um editorial de Carole R. Engle, editor do Journal of the World Aquaculture Society, intitulado “High-Impact Research: The Critical Need for Strong Engagement with Aquaculture Producers” (traduzindo: Pesquisas de alto impacto: as críticas necessárias para um forte envolvimento com o setor produtivo da aquicultura) e resolvi escrever esta coluna baseado nas discussões sobre este assunto que tive com minha colega, a Dra. Vanessa Villanova Kuhnen. O editor discorre sobre a importância em produzir pesquisas que gerem resultados com potencial para publicação em periódicos científicos de elevado fator de impacto (termo relacionado com o número de citações que recebe um artigo). Ele destaca a importância dos pesquisadores ao realizarem pesquisas não apenas em seus laboratórios, mas nos empreendimentos comerciais de aquicultura. Acho que seria “chover no molhado” discutir a relevância destas afirmações. Mas onde podemos chegar com esta abordagem simplificada do problema? E o que está acontecendo hoje no Brasil?

Há mais de duas décadas trabalho com pesquisa em aquicultura. Desde minha graduação sempre fui ligado ao segmento produtivo da aquicultura, seja implantando cultivos, realizando atividades de assessoria e consultoria e até mesmo produzindo peixes. O que tenho visto, ao longo do tempo, foi realmente um significativo distanciamento entre as necessidades do setor produtivo e as pesquisas realizadas pela academia (onde podemos incluir as universidades e outras instituições de ensino, pesquisa e extensão). Mas posso garantir, por experiência própria, que este distanciamento nem sempre ocorre por vontade das partes, mas sim pelas necessidades ditadas por entidades diversas que estabelecem as “regras do jogo”. Existe uma expressiva dificuldade de publicar, em periódicos de elevado impacto, artigos que apresentem pouca precisão estatística (ex. poucas réplicas) e que não abordem fronteiras do conhecimento. Por outro lado, as demandas do segmento produtivo apresentam muitas interfaces que exigem estudos em períodos de tempo mais prolongados, com indivíduos de maior peso, o que consequentemente, exigirá mais espaço e infraestrutura para realização das réplicas exigidas para precisão estatística e a obtenção de resultados confiáveis. Por exemplo, os estudos de nutrição de peixes marinhos, são feitos, em sua maioria com formas jovens, e em curtos períodos de experimentação. Decorre que os maiores desafios da cadeia produtiva estão na nutrição de peixes de maior peso (acima de 500 gramas) até o peso comercial (muitas vezes acima de 3 kg). Desta forma, podemos ver a dificuldade em transpor este desafio para compor parcerias.

Claro que este assunto é bem mais complexo que isto, mas dizer simplesmente que o pesquisador deve se aproximar e desenvolver seus trabalhos junto ao segmento produtivo, sem considerar as dificuldades inerentes do rigor no delineamento amostral que os periódicos científicos exigem para publicação, me parece uma forma de apenas “falar o que os ouvidos gostam de ouvir”…

Pensem em como é difícil um pesquisador entender a dinâmica de um empreendimento de aquicultura. Agora imaginem um empresário e os funcionários entenderem a forma de trabalhar do pesquisador. Tente alinhar as expectativas de ambos os lados. Vejam que expectativas não alinhadas geram frustações. E críticas de ambos os lados são comumente ouvidas em diferentes fóruns. Além disto, se por um lado os produtores esperam ansiosamente aplicar os resultados obtidos com a pesquisa, os pesquisadores são alijados pelas regras impostas pelos órgãos financiadores de suas pesquisas, que exigem cada vez mais volume de publicação em periódicos internacionais.

Apesar das dificuldades, muitos pesquisadores no Brasil têm rompido esta barreira, trabalhando alinhados com as necessidades do setor produtivo, o que tem resultado em excelentes artigos publicados em periódicos de elevado impacto e desatando grandes “nós” que existiam para produção nos empreendimentos comerciais de aquicultura. Apesar de ainda estarem longe de ser maioria, estão mostrando que este caminho é possível. Neste sentido as universidades e seus programas de pós-graduação podem fazer toda a diferença na formação dos jovens cientistas em possibilitar a aproximação destes com o setor produtivo. Assim como também cabe aos produtores “abrirem as porteiras” tendo a compreensão de que parte de seu empreendimento não irá produzir no ritmo comercial, pois estará seguindo o ritmo da ciência. Neste sentido, o programa de financiamento Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas, da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (FAPESP), tem possibilitado a aproximação entre pesquisador e empresa, com resultados animadores.

Acredito que temos muito o que evoluir para realmente aproximar a academia do setor produtivo. O setor produtivo tem demandas que precisam ser atendidas pela ciência. E a ciência tem que ser realizada, também, dentro da realidade de produção de organismos aquáticos. Como pudemos abordar, temos muitos bons exemplos de trabalhos feitos em cooperação pesquisador & empreendimentos de aquicultura no Brasil, o que nos deixa a certeza de que, apesar do longo caminho ainda a ser trilhado, nossos resultados indicam que estamos no rumo certo. Neste sentido, a Aquaculture Brasil tem um importante papel em proporcionar a aproximação entre estes dois mundos. Vida longa para esta iniciativa. Até a próxima coluna.

Por: Eduardo Gomes Sanches - Pesquisador Científico do Instituto de Pesca

 

Fonte: Aquaculture Brasil, Fev/2018 (http://www.aquaculturebrasil.com)
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